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Vale a pena ler, é para lavar a alma, lendo esta crônica voltei ao meu tempo que sofri bullying, discriminação, e sem dúvida, vou mandar minha filha ler também.
Todos os créditos ao escritor, jornalista e professor universitário, Fabrício Carpinejar.


SOU UM ASPIRADOR DE PÓ

Se quiser me ofender, terá trabalho.
Não facilito a vida do agressor.
Ele vai suar frio, passar sufoco, esclarecer questões, explicar posicionamentos.
Não sairei de cena chorando logo que ganhar um desaforo. Não aceitarei o figurino de vítima. Não me farei de coitadinho. Não me trancarei no quarto. Não evitarei o 
convívio.
Sou muito escolado em bullying para acolher rapidamente desaforo. Só eu mesmo posso me ofender e me perdoar – mais ninguém.
É o que todos deveriam pensar antes de sofrer.
O debochado não tem repertório. Ele guarda uma ou duas tiradas engraçadas que podem ser rebatidas com a autocrítica e inteligência.
Não se veja derrotado no início do jogo, não se enxergue constrangido por antecedência.
No Ensino Fundamental, na abertura das aulas, Marquinhos, líder da bagunça e das baixarias, buscou me humilhar na frente dos colegas. Quando a professora abandonou a 
sala para repor o giz, aproveitou a ausência e se aproximou de minha mesa.
Ele me analisou, analisou e despejou o veredito:
– Você tem cara de “aspirador de pó”.
O novo apelido vinha do nariz avantajado. Era uma versão doméstica para tamanduá.
Pronto: a turma inteira gargalhava alto de mim. A investida sugeria uma desmoralização do nome e sobrenome dali por diante.
Mas engoli a vergonha como uma aspirina a seco. Respirei fundo. E, de modo inédito, diferente de todas as vezes que me tolhi e me escondi, que fechei meu rosto nos 
braços, decidi responder. Concordei com a observação.
– Sim, eu sou um aspirador de pó.
Ele não atinou o que desejava concordando, e completei:
– Sou mesmo um aspirador de pó, que bom que você descobriu. Vem trocar meu saco!
Ele se calou. A turma agora reagiu a meu favor, dobrou o volume das risadas. Foi uma histeria coletiva, cadernos voando, pés batendo no chão, palmas estalando.
É certo que ele não sabia o que retrucar. Comeu a língua. Patinou na palavra. Demorou a perceber o estrago. Ficou branco, pálido, lesma.
Não contava com uma reação bem-humorada. Uma resposta espirituosa. Quem agride não programa a tréplica. Planejava criar uma tristeza em mim e abandonar a vítima no 
chão.
Mas não deixaria por menos. Nunca mais.
Marquinhos desapareceu ao longo do tempo, como poeira ranzinza da classe. Não esperava que o aspirador de pó estivesse ligado.
 

 

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