Vênus Negra (Vénus Noire)
Abdellatif Kechiche é um diretor primoroso, recentemente seu nome ganhou notoriedade com o "Azul é a Cor Mais Quente", mas seus filmes anteriores são tão bons quanto.
"Vênus Negra" baseado em fatos reais retrata a sordidez humana.
Saartjie, a Vênus Hotentote, nascida em 1789 às margens do Rio Gamtoos,
no atual Cabo Oriental, na África do Sul, é pertencente à família
Khoisan, mais conhecida como bosquímanos. Uma das características das
mulheres bosquímanas era a protuberância das nádegas, por excesso de
gordura, fenômeno conhecido como esteatopigia. Ela foi serva da família
Baartman, agricultores holandeses que moravam nas proximidades da Cidade
do Cabo. Convidada e iludida para se apresentar em espetáculos em
Londres a fim de adquirir dinheiro acaba sendo humilhada de diversas
maneiras.
A atriz cubana Yahima Torres deu vida a inocente Saartjie, seus olhares e silêncios nos dizem e emocionam muito, descobrimos um pouco dessa mulher que era doce, e que principalmente necessitava de afeto. Saartjie era exibida como um animal, uma aberração selvagem vinda da África, um lugar considerado extremamente exótico para os padrões europeus da época. As cenas são exibidas em longos planos, mostrando cada detalhe da apresentação, onde a mulher é tirada de uma jaula e exposta ao público curioso. Ela dança, toca, e é apalpada, fato que entristece muito Saartjie. Por causa de suas características físicas avantajadas e o tal do "avental hotentote" - pequenos lábios vaginais muito desenvolvidos, foi obrigada a submeter-se em terríveis situações.
A atriz cubana Yahima Torres deu vida a inocente Saartjie, seus olhares e silêncios nos dizem e emocionam muito, descobrimos um pouco dessa mulher que era doce, e que principalmente necessitava de afeto. Saartjie era exibida como um animal, uma aberração selvagem vinda da África, um lugar considerado extremamente exótico para os padrões europeus da época. As cenas são exibidas em longos planos, mostrando cada detalhe da apresentação, onde a mulher é tirada de uma jaula e exposta ao público curioso. Ela dança, toca, e é apalpada, fato que entristece muito Saartjie. Por causa de suas características físicas avantajadas e o tal do "avental hotentote" - pequenos lábios vaginais muito desenvolvidos, foi obrigada a submeter-se em terríveis situações.
A cena inicial já revela o racismo mascarado sob a forma de ciência.
Uma aula de anatomia que acontece na Paris do começo do século XIX. Na
ocasião, são comparados atributos físicos de uma mulher negra com
macacos. O médico enfatiza: "Eu nunca vi a cabeça de um ser humano tão
parecida com a de um macaco". Estudiosos acreditavam que os Hotentote
estavam muito próximos da raiz da espécie humana. E quando ficaram
sabendo das apresentações em Paris foram oferecer dinheiro em troca dela
ser objeto de estudos durante o dia todo, mas Saartjie tinha vergonha
de se despir completamente por conta de suas partes íntimas, e era
exatamente isso que os estudiosos precisavam para saber se ela era uma
hotentote legítima. Muito humilhante e completamente desumano a forma
como a tratam. É a perversidade humana em alto nível. Nesse momento ela
já estava com outro explorador, pois Caezar irritado com Saartjie a
vendeu para Réaux, que por sua vez era muito mais agressivo e não a
poupava nas apresentações, sendo tocada com muita violência.
Muitas vezes Saartjie dizia que não era escrava, que recebia salário e
que o que fazia era uma representação, como no teatro, fora dali era
livre. Sua submissão era demais, dizia ser burra, mas a verdade é que
ela não tinha para onde correr, e por isso aceitava sua bizarra
situação. O homem em quem confiou a colocou para fora de sua vida em
razão do dinheiro que foi perdido por ela não querer mostrar seus lábios
vaginais. Posta em outras mãos foi violentamente agredida, tanto
fisicamente como moralmente, sua imagem de mulher se destruiu por
completo.
Os olhos de Saartjie demonstram uma tristeza e um vazio imensurável,
além de fragilidade e impotência diante aqueles ao seu redor. O filme
faz questão de mostrar suas apresentações por inteiro a fim de que
retrate a desumanidade na espécie humana. E quando se pensa que nada
poderia piorar Saartjie é deixada a mercê da vida, acaba se
prostituindo, adoece, e mais uma vez é jogada na rua, sem ter mais
forças para ir adiante, falece, mas nem assim consegue ter paz. Réaux a
encontra e a vende para os estudiosos de Paris, que fazem um modelo a
partir de seu corpo. Seus restos mortais (esqueleto, órgãos genitais e
cérebro) ficaram expostos no Museu do Homem da França, até 1985. Houve
apelos esporádicos pela devolução dos seus restos mortais, e só em 2002
foram entregues à África do Sul.
"Vênus Negra" mostra de forma contundente o racismo científico, um
exemplo é a ideia de que o crânio do negro se assemelhava com o do
macaco, e de que vários aspectos da fisionomia eram "inferiores". Os
europeus se achavam e desejavam expor suas teorias. No século XIX o
racismo e a eugenia eram muito explícitas e ganharam força. A exotização
da mulher negra nasceu daí.
Muito se diz que os tempos são outros, mas querendo ou não o exótico
hoje em dia é vendido sob formas que aguçam a curiosidade. Uma amostra
são os pacotes turísticos vendidos mundo afora para se conhecer as
favelas do Brasil, ou as mulatas do carnaval que se exibem sem pudor
algum, e cuja imagem é vendida como o símbolo do país.
Os períodos históricos servem para analisarmos o racismo, no século
XIX era mascarado pela ciência, muitas ideias se difundiram e viraram
verdades que predominam até hoje. Na atualidade é algo velado, mas a
marginalização permanece, assim como o desprezo e a luta pela igualdade.
"Vênus Negra" é um filme chocante que mostra até onde vai a
ignorância do ser humano em explorar outro ser humano que foge dos
padrões ditos perfeitos.
Fonte: http://pitadadecinema.blogspot.com.br
Filme fortíssimo, que nos faz pensar muito sobre a humilhação e a exploração histórica das mulheres "fora dos padrões".
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